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Thursday, March 23, 2006

 

24 de Março de 1976

Uma amiga que é correspondente da Agência de notícias ANSA ( da Itália ) me pediu um texto sobre o dia do Golpe Militar de 1976 na Argentina. Este texto será transmitido por Radio para toda America Latina e Europa ( em Italiano, Portugues e Espanhol ) no dia em que esta data infeliz irá completar 30 anos. Então escrevi isto:


Eu me recordo perfeitamente do triste dia 24 de Março de 1976, a imagem em preto e branco de noticiario televisivo com a cena do helicoptero saindo da casa Rosada levando presa a presidente Isabelita Perón. Estranhamente para um menino de 13 anos , minha ocupação predileta era acompanhar a politica internacional. O fato é que por conta de uma disritmia adquiri fama de maluco na escola e por extensão no bairro de Porto Alegre onde eu vivia. Fama não desprovida de razão, visto que tinha alguns acessos históricos de fúria que vale dizer eram em geral provocados por sério ultraje a um rigoroso senso de justiça. Fúria da qual sinto certa falta hoje em dia ao me deparar com as safadezas institucionalizadas deste nosso admiravel mundo novo. Mas o fato é que a fama de louco nos obriga a viver em grande solidão e lá fui eu ler os muitos livros da biblioteca paterna e acompanhar como um jogo os lances da luta política no planeta terra, pois na verdade minha familia estava totalmente imersa nesta questão, visto que meu pai era um advogado libertario, militante dos direitos humanos e defensor dos presos do regime militar que ha 12 anos sufocava o Brasil, correndo risco pessoal e trazendo para dentro de casa ( ainda que procurando esconder dos filhos,ah, como os pais sao ingenuos! ) as cenas de terror que povoaram minha infancia atraves da escuta secreta de conversas familiares sobre torturas, sequestros e assassinatos. Misérias que meu pai acompanhava no exercício de seu quixotesco oficio. Mas foi por isto mesmo que desde cedo eu me envolvi com a política, ou melhor dizendo com sua negação, a ditadura militar. Lembro que tinha pesadelos horriveis que o despertar nao amenizava em nada . Eu vivia num mundo de contramão, em um bairro burgues que neste período passou a ser invadido pelos novos ricos do regime, permanentemente irritado com os colegas de colegio em seu entusiasmo ufanista regado pelas megaobras de engenharia do regime e também por grandes feitos futebolisticos da pátria. E com maior frequencia sendo expulso da classe por ser aquilo que os professores chamavam de uma liderança negativa. Mas a nave terra seguia seu rumo e eu continuava nas minhas leituras freneticas e imerso num jogo pessoal de torcer pelo que eu pensava ser a Revolução Mundial. Com pouco mais de 9 anos já eu lia o jornal com meu avô de criação e vibrava com os feitos do Vietcong na ofensiva do Tet, xingava um palhaço Uruguaio chamado Pacheco Areco e num dia horroroso de 73 cheguei a adoecer quando o Chile caiu. E foi assim que em março de 76 assisti num noticiario de tv a cena do helicoptero saindo da casa Rosada levando Isabelita presa. Era o começo do que vieram a chamar de El Processo. Na verdade o Estado se convertia numa maquina assassina . E já são 30 anos desta data, são outros os tempos. Aqui também, outro dia mesmo numa conversa com uma amiga ela me disse que as ditaduras são coisa do passado. Mas eu tenho minhas dúvidas. O que mais me incomoda hoje quando vejo a crise política envolvendo o governo do presidente Lula não é a decepção com seus compromissos e ideais, o que verdadeiramente me consome é assistir na tribuna de acusação das Comissoes de Inquerito os mesmos homens que rasgaram a constituição e foram - na qualidade de mandantes - autores de assassinatos políticos e responsaveis por anos de arbitrio. E então fico pensando no legado destes regimes que hoje parecem coisa do passado. A vida para mim é um processo permanente de educação, aprendemos pelo simpes fato de existir. E as ditaduras que assolaram este continente nos ensinaram atraves do silencio imposto pelo medo e pela mão assassina do estado que a vida não vale nada. De uma hora para outra qualquer um podia desaparecer.
Criaram uma maquina de moer gente que tinha muita fome e foi posta em ação com muita eficiência : Dispensaram-se até as formalidades de um julgamento, Suprimiu-se a diversidade. Acho que minha amiga não tem razao, a ditadura ensinou atraves da covardia e da omissão que a vida não vale nada. O país mais cristao do planeta bebe sangue nas paginas de jornal diariamente e o medo que sufoca as pessoas faz com que clamem todos os dias por mais soluções de força. Cada dia que passa por aqui reafirma que nossa vida não vale nada.
Herdamos um triste legado. Aquele helicoptero não era apenas uma pagina a mais num continente onde as avenidas e pontes tem nomes de assassinos e a tv mostra na cena política homens que rasgaram a constituição evocando a moralidade publica. Era o nicio de um novo processo educativo que afirmava que a vida não vale nada. Quem viveu nestes regimes tem a alma marcada igual a de uma criança que assiste no silencio da noite uma violencia sexual. Aquele helicoptero que vi na tv era o prenuncio do estupro de uma nação inteira. É uma pena, mas minha amiga incorreu em erro. A vida por aqui não vale nada.

Comments:
Não deixar esquecer é o mínimo que podemos fazer. Para aqueles que não "estavam lá" ou "esqueceram" leiam o último poema de Victor Jara

Somos cinco mil
en esta pequeña parte de la ciudad.
Somos cinco mil
¿ Cuántos seremos en total
en las ciudades y en todo el país ?
Solo aqui
diez mil manos siembran
y hacen andar las fabricas.

¡ Cuánta humanidad
con hambre, frio, pánico, dolor,
presión moral, terror y locura !

Seis de los nuestros se perdieron
en el espacio de las estrellas.

Un muerto, un golpeado como jamas creí
se podria golpear a un ser humano.
Los otros cuatro quisieron quitarse todos los temores
uno saltó al vacio,
otro golpeandose la cabeza contra el muro,
pero todos con la mirada fija de la muerte.

¡ Qué espanto causa el rostro del fascismo !
Llevan a cabo sus planes con precisión artera
Sin importarles nada.
La sangre para ellos son medallas.
La matanza es acto de heroismo
¿ Es este el mundo que creaste, dios mio ?
¿Para esto tus siete dias de asombro y trabajo ?
en estas cuatro murallas solo existe un numero
que no progresa,
que lentamente querrá más muerte.

Pero de pronto me golpea la conciencia
y veo esta marea sin latido,
pero con el pulso de las máquinas
y los militares mostrando su rostro de matrona
llena de dulzura.
¿ Y Mexico, Cuba y el mundo ?
¡ Que griten esta ignominia !
Somos diez mil manos menos
que no producen.

¿Cuántos somos en toda la Patria?
La sangre del companero Presidente
golpea más fuerte que bombas y metrallas
Asi golpeará nuestro puño nuevamente

¡Canto que mal me sales
Cuando tengo que cantar espanto!
Espanto como el que vivo
como el que muero, espanto.
De verme entre tanto y tantos
momentos del infinito
en que el silencio y el grito
son las metas de este canto.
Lo que veo nunca vi,
lo que he sentido y que siento
hara brotar el momento...



(Victor Jara, Estadio Chile, Septiembre 1973)

abraço alemão
maia
 
Alemão, Moa me deu um presente me passando o endereço do seu blog.
Parabens, velho!
Um abraço!
 
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